segunda-feira, 21 de setembro de 2020

SPEECH

QUANDO NÃO SE FAZ A LIÇÃO DE CASA


(Por: Solange Galante)





Todos assistimos chocados às queimadas no Pantanal Matogrossense. A antecipação da seca no Rio Paraguai, aliada às queimadas propositais (limpeza de pasto) descontroladas, bem como fatores menores e isolados (bitucas de cigarro, balões não tripulados etc)  provocou vários focos de incêndio que se tornaram gigantescos e unidos e vão ganhando espaço por mais que civis, militares da FAB (a primeira a chegar), Marinha e Exército lutem dia e noite para combatê-los.

É uma tragédia ambiental brasileira que não se resume a ficarmos com o coração partido ao ver jacarés calcinados tão rápido que nem tiveram tempo de se mover; onças, antes poderosas, agora totalmente indefesas com as quatro patas em carne viva, antas com a pele queimada se soltando e aves, mesmo as que conseguem fugir do fogo, morrendo sem ter alimento. 

incêndio no Pantanal afeta a biodiversidade, promovendo a possível extinção de espécies animais endêmicas, sejam vertebrados quanto invertebrados, além de também a flora, pois a Natureza se regenera, sim, mas para tudo há limite, e não resta dúvida que esse fogaréu ultrapassou muitos limites de tolerância natural.

Mas o incêndio também afeta propriedades rurais, ecoturismo, economia extrativista, enfim, toda uma cadeia econômica da região, que irá se refletir na economia do país inteiro. Sem contar o inevitável impacto ao clima além das fronteiras pantaneiras (leia-se, inclusive no sudeste e sul).

Em agosto de 1999 fiz as fotos que ilustram este texto. Tratava-se da visita do Bombardier/Canadair CL-215 a São Paulo, sob patrocínio da empresa LRC, sediada no Campo de Marte, na capital paulista. Na ocasião, a aeronave, que ficou por apenas alguns dias no Brasil, recebeu o nome provisório de Princesa de São Paulo. Tratava-se de uma promoção da fabricante canadense para vender ao governo paulista não exatamente o CL-215 mas, principalmente, o CL-415, a versão turbo-hélice desse avião de combate a incêndios florestais, muito utilizado na América do Norte (o CL-215 tem motores a pistão). Coincidentemente, pouco antes do avião ir embora houve um pequeno incêndio em matas na Grande São Paulo e ele fez sua demonstração real. Porém, ainda assim, o governo paulista, manifestando-se em definitivo semanas depois, não se interessou em adquirir sequer uma aeronave daquelas. Na época, fiz uma pequena nota a respeito para a Aviação em Revista.

Na ocasião, eu escrevia quase mensalmente sobre Aviação Agrícola para a mesma Aviação em Revista e já se discutia o uso de aviões dessa atividade nos combates a incêndios na natureza. Pilotos se mobilizavam, bem como o Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola (SINDAG) para que fosse formada uma frota nacional com essa intenção. Essas aeronaves eram usadas muito esporadicamente e de maneira improvisada para combate ao fogo. Hoje, já há algumas dedicadas especialmente para isso, como o Air Tractor 802, inclusive sendo utilizadas por exemplo, pelo Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal. Mas todos sabemos que isso não é o suficiente, ainda mais diante das previsões trágicas de que os incêndios florestais em todo o mundo irão se tornar mais frequentes e intensos devido ao tão debatido aquecimento global – acredite ou não ele existe e é um fator contribuinte do agravamento das secas. 

Não resta a menor dúvida de que, pelas dimensões continentais do Brasil, precisaríamos ter não um, mas vários aviões de combate a incêndios de grande porte. Nos Estados Unidos e também no Canadá – que possui significativa parte do território ainda coberto por florestas nativas – operam aviões DC-10, Electra II e até Boeing 747 e, mesmo assim, eles têm problemas para combater os próprios incêndios. Na Rússia, também um país gigante, o Beriev Be-200 destaca-se para a mesma missão. É certo que o Brasil utiliza com sucesso os Hércules C-130 da FAB adaptados para o combate ao fogo mas, porque delegar mais essa missão unicamente às nossas forças armadas, o "Posto Ipiranga" de um pais repleto de problemas o ano inteiro? Melhor, desta vez, fazer a lição de casa não feita por São Paulo em 1999, antes que troquemos o VERDE de nossa bandeira pelo CINZA.


Nenhum comentário:

Postar um comentário