E O AZAR DELE TER VINDO PARAR... AQUI!!!
Por: Solange Galante
O PP-VBF já aposentado, em 20 de julho de 1998. (Foto: Solange Galante)
A repercussão da destruição do Douglas DC-3 PP-VBF que estava inteiro na área do Aeroporto Internacional do Rio de Janeiro até o dia 31 de janeiro passado, é a reprise de outras tantas "novelas" brasileiras semelhantes. Já perdi/perdemos as contas de quantas aeronaves, que poderiam ter sido preservadas, foram desmanchadas, picotadas, incendiadas ou exportadas ao longo das décadas. Mesmo as que ainda estão "de pé" correm sério risco de destruição, por ação do tempo ou de pessoas.
Quando o Savoia Marchetti S.55 "Jahú" estava cheio de cupins no subssolo do Museu de Aeronáutica de São Paulo, no Parque do Ibirapuera, ouvi e li "N" entusiastas falando dele e clamando "Precisamos salvar o Jahú!". Em vão. Foi só muitos anos depois, quando ninguém mais sequer clamava a favor do enorme hidroavião – único de seu modelo no mundo inteiro, diga-se de passagem – que o extinto Projeto Jahú, do qual fiz parte, não só o tombou pelo Condephaat (veja documento em http://condephaat.sp.gov.br/benstombados/hidroaviao-jahu/) como também conseguiu que fosse removido para um dos hangares do Grupamento de Radiopatrulha Aérea João Negrão, da PM paulista, no Campo de Marte, para a descupinização da aeronave – primeiríssima etapa antes de seu restauro, que seria, depois, conduzido pelo Helipark, em Carapicuíba.
Várias partes estruturais do avião de madeira já não existiam mais e teriam que ser reconstruídas. O hidroavião, disputado pela Fundação Santos Dumont, cidade de Jaú e família de João Ribeiro de Barros enquanto era "jantado" pelos insetos, foi emprestado para o Museu da TAM. Que, todos sabemos, fechou e corre o risco de ser literalmente destruído pela Latam, conforme algumas fontes que preferem não se identificar.
Há alguns meses escrevi neste Blog sobre o caso do A-26 que foi embora para os Estados Unidos, quando deveria ter permanecido em exposição aqui no Brasil. (https://caixapretadasolange.blogspot.com/2019/07/speech.html)
Temos ainda o famoso caso do Scandia no Museu dos Transportes de Bebedouro. Esse Scandia também é o único do mundo e consta que a fabricante sueca SAAB quis restaurá-lo e devolvê-lo brilhando para o Brasil... mas a oferta foi recusada. E está deteriorando em Bebedouro.
O PP-SMA da Vasp, o primeiro Boeing 737-200 do Brasil e provavelmente o mais antigo do modelo a pertencer a apenas uma cia. aérea, depois de ser descaracterizado e de passar por várias mãos, está na área metropolitana de Belo Horizonte nas mãos de quem não dá a mínima para a história do avião, conforme já comprovado por quem falou com o proprietário atual. Seu primeiro proprietário, após ter sido infeliz com a equipe que o desmontaria, colocou-o à venda e eu, pessoalmente, entrei em contato com a Boeing, que apenas se dispôs a fornecer informações para seu possível restauro, se fosse o caso, e depois, falei com o João Amaro, que disse que o Museu não teria condições financeiras de desmontá-lo e trasportá-lo para Araraquara. Ou seja, o azar do Mike Alfa foi ter parado de voar justamente em Confins, se tivesse parado em Congonhas ou Guarulhos, poderia até mesmo ter sido salvo, como aconteceu com os PP-SFI e PP-SMW do Cmte. Capístrano, um dos poucos heróis que restauraram os aviões que adquiriram em leilão da Vasp.
Algumas notícias sobre o SMA publiquei no meu Blog: (entre outros links, estes abaixo)
https://caixapretadasolange.blogspot.com/2013/09/plantao-caixa-preta_23.html
Também o trio de Airbus da mesma Vasp teve fim inglório. O SNL e o SNN, em Congonhas, foram picotados inteiramente e o SNM, em Guarulhos, após ter sido depenado, segundo seu arrematador em leilão, que, por isso, se recusou a retirá-lo do aeroporto a não ser que o GRU Airport se manifestasse a respeito, foi também desmontado, com respaldo judicial.
Enquanto isso, além do A-26 levado daqui para os EUA, a Alemanha levou embora o 737-200 da TAF (ex-TAF PT-MTB ex-Lufthansa D-ABCE), que jazia abandonado em Fortaleza.
O primeiro Boeing 767-200 do Brasil, o PT-TAA da Transbrasil foi arrematado também por pessoas que ainda não lhe deram um destino, nem sequer decretando sua extinção também, ou seja, está semi-abandonado, semi-desmontado, inteiramente sob intempéries em Brasília, certamente até se desmanchar.
Segundo o link a seguir (https://fentac.org.br/nota-sobre-a-destruicao-do-aviao-da-varig-no-hangar-do-galeao/?fbclid=IwAR0FZKRkizc9-unrfDkLAYKrX6MiXErSZ1hmZuzECDAHo2hFrVFi34QKDGU), da Federação Nacional dos Aeronautas, Aeroviários, Aeroportuários, e Trabalhadores em Serviços Auxiliares em Transporte Aéreo (FENTAC), a Massa Falida da Varig não teve outra alternativa a não ser o desmonte total do DC-3, com autorização da Justiça. A principal justificativa era não onerar os credores (leia-se ex-funcionários da Varig), além de alegarem forte corrosão na estrutura do Douglas. Os entusiastas, revoltados, alegam que, em caso de dificuldades para remover a aeronave sem ser destruída, bastava que a Massa Falida pedisse ajuda para isso – e, supostamente, teria.
A mesma Alemanha que levou o PT-MTB, ex-Lufthansa, de volta à pátria, mantém, em seu Museu de Sinsheim tem um Junkers JU-87 Stuka (bombardeiro da Segunda Guerra Mundial) que havia sido retirado do fundo do Mar Mediterrâneo e estado lastimável e foi, ainda assim, respeitado e preservado no museu de tecnologia da cidade. Estava muito mais corroído que o DC-3 do Rio de Janeiro.
A "nota de esclarecimento" do Sindicato diz "a destruição do DC-3 da Varig, corroído e sem qualquer capacidade de utilização, não é um atentado à nossa história. Como já dito, existe um similar em Porto Alegre aberto para visitações."
Diante disso, quero fazer um paralelo (apenas um): dos 20 exemplares do supersônico Concorde, já retirado de serviço, você poderá visitá-lo e conhecê-lo na Alemanha. Mas se você quiser ver um de perto e estiver na França, não tem problema, lá também tem pelo menos três. Mas eis que você mora nos EUA e não quer cruzar o oceano para ver um Concorde à sua frente. Não tem problema, lá também tem uns três. Isso sem contar os que estão no Reino Unido.
Falando em Estados Unidos, aquele também é um país bem grande, de dimensões continentais, como o Brasil. Mas lá, diferentemente daqui, as pessoas têm menos dificuldade para se deslocar pelo território, e lá há vários grandes núcleos populacionais padrão São Paulo ou Rio de Janeiro. O Sindicato quer que qualquer brasileiro se desloque até Porto Alegre, mesmo os do Norte do Brasil, para ver um DC-3. Rio de Janeiro é um pouco mais perto, já facilita um pouco, e o ideal seria termos aviões históricos, museus históricos não num lugar só, mas no país todo. E a ação da Massa Falida da Varig só atrasou ainda mais esse processo. Ou seja: não basta ter um em Porto Alegre, ter dois com as cores da Varig seria ainda aquém do necessário pelo importância histórica do Brasil em relação à aviação.
Mas eu sei o quanto é custoso manter um avião histórico. Eu acompanhei praticamente todos os leilões de aeronaves da Vasp e percebi o entusiasmo dos arrematantes ser substituído por uma grande frustração ao encarar os custos de desmonte, remoção e remonte de cada um daqueles aviões – o que provocou alguns a desistirem e deixarem a aeronave no aeroporto mesmo. Pouquíssimo arrematantes procuram preservar os Boeings.
Ou seja: no Brasil, em relação à preservação de seu passado (sem lembrar casos terríveis não relacionados à a aviação, como o incêndio do Museu Nacional) primeiro há os que levantam a lebre mas não movem um dedo para ajudar na solução do problema. Depois, há falta de dinheiro, que causa a paralisação das ideias de transformar a aeronave mesmo em restaurante, por exemplo, ainda pior se a ideia for de preservação. Associações de aeronaves Antigas e Clássicas lutam diariamente pelas isenções fiscais e incentivo. E olha que nem estamos falando de manter sempre lindo um DC-3, lutam até pela preservação de um Cessninha!
Claro que essa história não tem moral! Moral alguma! Fim de
casarões históricos na Av Paulista. O Museu Nacional ardendo em chamas no Rio de Janeiro. A lança do monumento ao índio da Pça Oswaldo Cruz, em São Paulo, furtada inúmeras vezes após reposta, assim como os óculos de Carlos Drummond de Andrade, no Rio de Janeiro, Objetos furtados do Museu de Aeronáutica de São Paulo, quando ocupava a "Oca". Museu Asas de um Sonho vivendo seu grande pesadelo. A todo momento e em todos os cantos do país, descaso sobre descaso. Historiadores individuais como os saudosos Germano Bensmüller e Carlos Dufriche poderiam ter ajudado a salvar o VBF mas eu sei das dificuldades que teriam que eliminar. Também sei que museus, ainda mais de "aviação", que é considerada uma atividade "menor" por empresas públicas e privadas que poderiam ajudá-la, lutam para sobreviver no mundo inteiro. Mas, em países como os EUA, Alemanha, França e Inglaterra há mais interesse coletivo em preservar esse tipo de patrimônio. Quando falo de interesse "coletivo" incluo civis e militares também. Já vi muitas organizações militares brasileiras descuidando do próprio patrimônio. Especificamente sobre o VBF, fica a pergunta: porque não se pediu ajuda pública, de entusiastas? Por que pelo menos não se tentou (como eu tentei, em relação ao PP-SMA da Vasp e em relação ao PT-TAA da Transbrasil, contatando possíveis interessados em adquiri-los), deixando a situação chegar onde chegou, se até a carta abaixo circulou nas redes sociais, provando que o MUSAL tinha interesse na remoção de partes, pelo menos (para isso, teria que ser desmontado, era óbvio)?
Quando o Savoia Marchetti S.55 "Jahú" estava cheio de cupins no subssolo do Museu de Aeronáutica de São Paulo, no Parque do Ibirapuera, ouvi e li "N" entusiastas falando dele e clamando "Precisamos salvar o Jahú!". Em vão. Foi só muitos anos depois, quando ninguém mais sequer clamava a favor do enorme hidroavião – único de seu modelo no mundo inteiro, diga-se de passagem – que o extinto Projeto Jahú, do qual fiz parte, não só o tombou pelo Condephaat (veja documento em http://condephaat.sp.gov.br/benstombados/hidroaviao-jahu/) como também conseguiu que fosse removido para um dos hangares do Grupamento de Radiopatrulha Aérea João Negrão, da PM paulista, no Campo de Marte, para a descupinização da aeronave – primeiríssima etapa antes de seu restauro, que seria, depois, conduzido pelo Helipark, em Carapicuíba.
O Jahú quando estava no Helipark. (Crédito: Divulgação Helipark)
Há alguns meses escrevi neste Blog sobre o caso do A-26 que foi embora para os Estados Unidos, quando deveria ter permanecido em exposição aqui no Brasil. (https://caixapretadasolange.blogspot.com/2019/07/speech.html)
Temos ainda o famoso caso do Scandia no Museu dos Transportes de Bebedouro. Esse Scandia também é o único do mundo e consta que a fabricante sueca SAAB quis restaurá-lo e devolvê-lo brilhando para o Brasil... mas a oferta foi recusada. E está deteriorando em Bebedouro.
O PP-SMA da Vasp, o primeiro Boeing 737-200 do Brasil e provavelmente o mais antigo do modelo a pertencer a apenas uma cia. aérea, depois de ser descaracterizado e de passar por várias mãos, está na área metropolitana de Belo Horizonte nas mãos de quem não dá a mínima para a história do avião, conforme já comprovado por quem falou com o proprietário atual. Seu primeiro proprietário, após ter sido infeliz com a equipe que o desmontaria, colocou-o à venda e eu, pessoalmente, entrei em contato com a Boeing, que apenas se dispôs a fornecer informações para seu possível restauro, se fosse o caso, e depois, falei com o João Amaro, que disse que o Museu não teria condições financeiras de desmontá-lo e trasportá-lo para Araraquara. Ou seja, o azar do Mike Alfa foi ter parado de voar justamente em Confins, se tivesse parado em Congonhas ou Guarulhos, poderia até mesmo ter sido salvo, como aconteceu com os PP-SFI e PP-SMW do Cmte. Capístrano, um dos poucos heróis que restauraram os aviões que adquiriram em leilão da Vasp.
Algumas notícias sobre o SMA publiquei no meu Blog: (entre outros links, estes abaixo)
https://caixapretadasolange.blogspot.com/2013/09/plantao-caixa-preta_23.html
Também o trio de Airbus da mesma Vasp teve fim inglório. O SNL e o SNN, em Congonhas, foram picotados inteiramente e o SNM, em Guarulhos, após ter sido depenado, segundo seu arrematador em leilão, que, por isso, se recusou a retirá-lo do aeroporto a não ser que o GRU Airport se manifestasse a respeito, foi também desmontado, com respaldo judicial.
Enquanto isso, além do A-26 levado daqui para os EUA, a Alemanha levou embora o 737-200 da TAF (ex-TAF PT-MTB ex-Lufthansa D-ABCE), que jazia abandonado em Fortaleza.
O primeiro Boeing 767-200 do Brasil, o PT-TAA da Transbrasil foi arrematado também por pessoas que ainda não lhe deram um destino, nem sequer decretando sua extinção também, ou seja, está semi-abandonado, semi-desmontado, inteiramente sob intempéries em Brasília, certamente até se desmanchar.
O B767 PT-TAA em Brasília, em 2012 (Foto: Solange Galante)
A mesma Alemanha que levou o PT-MTB, ex-Lufthansa, de volta à pátria, mantém, em seu Museu de Sinsheim tem um Junkers JU-87 Stuka (bombardeiro da Segunda Guerra Mundial) que havia sido retirado do fundo do Mar Mediterrâneo e estado lastimável e foi, ainda assim, respeitado e preservado no museu de tecnologia da cidade. Estava muito mais corroído que o DC-3 do Rio de Janeiro.
Corroído pelo Mar Mediterrâneo mas, ainda assim, imponente, o Stuka de Sinsheim.
(Foto: Solange Galante, 2015)
A "nota de esclarecimento" do Sindicato diz "a destruição do DC-3 da Varig, corroído e sem qualquer capacidade de utilização, não é um atentado à nossa história. Como já dito, existe um similar em Porto Alegre aberto para visitações."
Diante disso, quero fazer um paralelo (apenas um): dos 20 exemplares do supersônico Concorde, já retirado de serviço, você poderá visitá-lo e conhecê-lo na Alemanha. Mas se você quiser ver um de perto e estiver na França, não tem problema, lá também tem pelo menos três. Mas eis que você mora nos EUA e não quer cruzar o oceano para ver um Concorde à sua frente. Não tem problema, lá também tem uns três. Isso sem contar os que estão no Reino Unido.
Falando em Estados Unidos, aquele também é um país bem grande, de dimensões continentais, como o Brasil. Mas lá, diferentemente daqui, as pessoas têm menos dificuldade para se deslocar pelo território, e lá há vários grandes núcleos populacionais padrão São Paulo ou Rio de Janeiro. O Sindicato quer que qualquer brasileiro se desloque até Porto Alegre, mesmo os do Norte do Brasil, para ver um DC-3. Rio de Janeiro é um pouco mais perto, já facilita um pouco, e o ideal seria termos aviões históricos, museus históricos não num lugar só, mas no país todo. E a ação da Massa Falida da Varig só atrasou ainda mais esse processo. Ou seja: não basta ter um em Porto Alegre, ter dois com as cores da Varig seria ainda aquém do necessário pelo importância histórica do Brasil em relação à aviação.
Mas eu sei o quanto é custoso manter um avião histórico. Eu acompanhei praticamente todos os leilões de aeronaves da Vasp e percebi o entusiasmo dos arrematantes ser substituído por uma grande frustração ao encarar os custos de desmonte, remoção e remonte de cada um daqueles aviões – o que provocou alguns a desistirem e deixarem a aeronave no aeroporto mesmo. Pouquíssimo arrematantes procuram preservar os Boeings.
Ou seja: no Brasil, em relação à preservação de seu passado (sem lembrar casos terríveis não relacionados à a aviação, como o incêndio do Museu Nacional) primeiro há os que levantam a lebre mas não movem um dedo para ajudar na solução do problema. Depois, há falta de dinheiro, que causa a paralisação das ideias de transformar a aeronave mesmo em restaurante, por exemplo, ainda pior se a ideia for de preservação. Associações de aeronaves Antigas e Clássicas lutam diariamente pelas isenções fiscais e incentivo. E olha que nem estamos falando de manter sempre lindo um DC-3, lutam até pela preservação de um Cessninha!
***MORAL DA HISTÓRIA***
(Reprodução do Facebook)
A resposta talvez seja a única para todos esses casos de aviões citados o azar foi estarem no Brasil !!! E não terem tido uma Alemanha ou uma Suécia para cuidar deles, já que até os EUA cuidam melhor lá do que deveria ter permanecido aqui. Vamos para lá visitar o A-26, então?
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