domingo, 21 de julho de 2019

***Colaboração***

***EXCLUSIVO***

O QUE OS ACIDENTES DA
AIR FRANCE, LION AIR E ETHIOPIAN AIRLINES TÊM EM COMUM?*




Muito se tem especulado nas mídias sociais a respeito dos acidentes envolvendo o novo avião da Boeing, o 737-MAX. O que não falta é gente se vendendo como profundo conhecedor do assunto e levando aos leigos informações que foram simplesmente copiadas de alguma informação vindo do fabricante. Muito se fala também do MCAS que, segundo alguns, a Boeing, com intenção de vender aviões e ganhar a competição contra a rival Airbus, escondeu até do órgãos homologadores em todos os continentes. Se é verdade, a mesma está pagando um preço alto por colocar o próprio nome em descredito junto ao público. Muitos até já trocaram o jargão antigo "If not boeing, I'm not going" para "If boeing, I ain't going", demonstrando a falta de confiança na até então maior e mais segura fabricante de aviões do planeta.

O que ninguém comenta é que os acidentes demonstram algo muito, mas muito mais sério. Como exposto na chamada deste artigo, os três acidentes com aeronaves de tecnologia bastante diferentes têm algo em comum e que precisa ser solucionado a fim de mitigar outros desastres futuros: a falta de treinamento e aderência às "velhas" normas e procedimentos pelas novas gerações mesmo quando voando um equipamento "State of Art". Basta ler o relatório final do acidente do Air France (AF 447, de 31 de maio de 2009) saindo do Rio de Janeiro para Paris e verificar que os copilotos não entenderam o que estava acontecendo e nenhum deles estava voando a aeronave, o nariz foi mantido alto em condição de estol e somente o comandante, ao chegar na cabine, infelizmente tarde demais, se deu conta de que um dos pilotos mantivera a condição de estol. Se o mesmo houvesse olhado para o PFD (Primary Flight Display) ou horizonte artificial, como queiram, teria entendido o que estava acontecendo.

No acidente da Lion Air, o copiloto foi solicitado para ler o check list de Airspeed Unreliable mas, como não o achava, o Comandante cometeu um erro grave que custou a vida de muitos: entregou a pilotagem em condição anormal para o copiloto, pode até não ser uma regra, mas sempre foi o padrão de que, em condição de emergência, o próprio Comandante voe a aeronave, partindo do pressuposto de que o Comandante é o que tem mais experiência e horas de voo na cabine de comando. Quando o Comandante atentou para a condição de nariz acentuado para baixo, não havia mais como recuperar a aeronave devido à inércia da mesma. No caso da Ethiopian aconteceu algo semelhante, ou seja, em todos os casos alguém esqueceu ou não lhe foi ensinado de que em aeronaves a jato se voa "Pitch" (arfagem) ou não cumpriram com o que esta escrito no FCTM (Flight Crew Training Manual) concernente à função de PF (Pilot Flying).

Hoje, na pressa de formar novos pilotos devido à falta de mão de obra, tudo é realmente feito às pressas, até o treinamento. No Brasil, a ANAC acabou, há alguns anos, com a obrigatoriedade do curso teórico de Piloto Privado, que é o primeiro degrau na vida de um aspirante a piloto de linha aérea, ou seja, a base de tudo foi relegada a segundo plano. Por outro lado, as empresas, com o foco nos lucros e confiando de que a alta confiabilidade dos aviões da Boeing ou na "build in protection" dos modelos Airbus não permitirão os pilotos de cometerem erros, cada vez mais apresentam cursos mais reduzidos para os novos candidatos. Infelizmente, a nova geração chegou, com falta de comprometimento, direto do aeroclube para a cabine de um grande jato, não tendo tempo para ganhar maturidade, e a dependência de um smartphone para tudo, ajudou na degradação do padrão da aviação mundial. Pergunte a um copiloto novo qual o "pitch" à ser mantido em caso de Airspeed Unreliable em voo de cruzeiro: a maioria não saberá responder ou tentará apresentar uma desculpa para o seu pouco interesse no assunto, que pode custar a sua própria vida. No simulador, é fácil identificar a falta de proficiência técnica devido à pouca experiência, pilotos querendo engajar o Piloto Automático mais os modos automáticos de navegação lateral e vertical como forma de resolver uma situação que o mesmo deveria fazê-lo até a completa estabilização da aeronave. O que é pior, delegam ao automatismo a sua própria vida.

O que esperar do futuro? Que as autoridades melhorem o nível de treinamento e que as regras básicos do voo não sejam esquecidas em detrimento do lucro, ou que os aviões venham mais automatizados e com mais proteções para evitar que uma simples pane possa ser a causa de um acidente fatal pela falta de comprometimento com a Segurança de Voo.

O que nos reserva no futuro, só o tempo dirá. Hoje, já se encontram em andamento testes com robôs na cabine de comando para comandar a aeronave, num primeiro momento para eliminar um dos pilotos e, provavelmente, mais tarde, a realização de voos comandados por máquinas sem a presença humana nos controles. Ficção científica? Premonição? Realidade? só o futuro mostrará. A verdade é que, enquanto existirem seres humanos exercendo funções na cabine de comando transportando vidas humanas, a base sempre será um bom treinamento para que se possa identificar e solucionar as situações anormais que possam vir a ocorrer durante o exercício da profissão. Com certeza, novos tipos de situações anormais deverão ser incorporadas aos já extensos QRH (Quick Reference Handbook) presentes na cabine de comando, um capítulo a mais de como atuar quando, porventura, o robô sentado na cadeira da direita estiver mal-humorado, será bem-vindo.

* Colaboração de um comandante da Lion Air que prefere não se identificar

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