AFINAL, QUEM PERDE?
(reprodução de rede social)
NÃO FORAM SÓ OS AVIADORES QUE PERDERAM, VIU?
(por Solange Galante)
Como já comentei neste Blog, não estou aqui para especular sobre acidentes aéreos e quando escrevo sobre acidentes na Aviação são os que já tiveram relatório concluído. No caso de incidentes, são os fatos, jamais "fake news". Basta ver o que já publiquei na revista Aero Magazine, na revista Flap Internacional, e neste Blog. Que, aliás, como meu canal na internet, não é monetizado e nem recebe Super Chat – pois há "Influencers" – antigamente eram chamados só de Youtubers – que afirmam "eu não monetizo sobre assuntos que até o Youtube proibe" MAS recebem com todo gosto os Super Chats dos vídeos dos mesmos assuntos (aí não é proibido).
Minha especialidade é analisar o impacto da comunicação sobre a Aviação. Reportagens, apresentações, noticiários, publicações nas mais diversas mídias e etc. Especialmente neste século em que, tristemente, todo mundo acha que é fotografo, cinegrafista, redator, repórter só porque tem um "smartphone" e tem onde publicar na internet. Antes fosse só assim, mas a responsabilidade sobre um conteúdo informativo, opinativo ou interpretativo é muito mais séria que tocar numa tela para gravar alguma coisa.
Assisto a dois fenômenos bem atuais.
1) a disputa FEROZ pela audiência, já que o engajamento, a monetização e as visualizações são o objetivo em comum. E tem que ser assim no mundo capitalista. PORÉM, e onde entra a QUALIDADE dessa informação engajada, visualizada, monetizada??? Todo dia assisto a pelo menos um vídeo novo de algum dos vários canais em que sou inscrita e já tenho meus preferidos sobre os mais diversos temas (não só aviação) que, inclusive, já me ajudaram na culinária, na saúde, na ampliação do meu repertório geral etc. MAS, e quando essa disputa carece de qualidade? E quando o resultado pode ser "considerado" jornalismo? Ou o resultado passa a ser "notícia"? E se vem DISFARÇADO de seriedade e prestação de serviço ou educação?
2) o que mais há hoje na Rede é o que costumo chamar de "jornalismo rasteiro", ou "em voo rasante", sem profundidade. Isso sempre existiu, mas parece erva daninha, hoje em dia, de tanto que cresce e com tanta rapidez. Pode ser considerado o jornalismo de escrivaninha de antigamente, em que as notícias muitas vezes são produzidas sem se levantar o traseiro da cadeira – algumas vezes, apenas e exclusivamente para beber café – o jornalista pegava todas as informações por telefone – hoje, pela internet – e redigia a notícia sem acrescentar nada que não pudesse alcançar a partir de uma peça de mobília composta de um assento individual e um encosto, tendo ou não braços, tendo ou não quatro pernas.
Isso serve muito bem para a notícia quentinha, seja num jornal ou na internet. Mas, não para a profundidade requerida ao se analisar algo muito mais complexo, desenvolvido a partir da notícia inicial, como a análise de um acidente aéreo.
Atenção ao EXEMPLO abaixo:
Há pouco mais de um mês publiquei aqui no Blog uma matéria sobre um acidente aéreo com mais de 40 anos desde ocorrido. Para escrevê-lo, fui atrás de fontes, inclusive personagens da época e até paguei por uma cópia de jornal – e não foi barato – em biblioteca pública. Tudo visando apresentar os mais diferentes aspectos do ocorrido. E, ufa!!! consegui! Foram meses de dedicação e, atualmente, é minha postagem das mais visualizadas no Blog. Tudo sem sensacionalismo, respeito pelos personagens reais, e mostrando aspectos pouco comentados por qualquer estudioso de acidentes assemelhados.
Coincidentemente, na mesminha semana em que publiquei prontinho esse meu texto, resultado dos meses de pesquisa – fora da escrivaninha, aliás – um "influencer" recebeu um input, foi instigado a falar do mesmo acidente de quatro décadas antes – sobre o qual confessou nunca ter ouvido falar. E ele partiu do zero, ainda desconhecia o fato sobre o qual pesquisaria e apresentaria um vídeo pouco mais de um mês depois.
Como hábito, sempre que eu assisto a algum vídeo, sempre dou uma olhada também no chat e/ou comentários, o que sempre diz muito, senão TUDO, sobre o público daquele canal.
A partir de agora, vou tecer algumas análises sobre comentários que pincei desse vídeo que surgiu sobre o acidente que eu já tinha escrito e publicado. E sem identificar os comentaristas, pois não é o objetivo criticar ninguém, mas sim atentar para os FATOS e suas CONSEQUÊNCIAS. (Tenho fotos de tela de todos eles, caso alguém queira ter certeza de que são reais.)
"(Você) sempre
fala que que as investigações não buscam culpados mas a maioria dos acidentes
que vejo aqui é culpa dos pilotos."
"Assistindo
esse vídeo maravilhosamente produzido, você entende o que irrita boa parte dos
(seus) haters: Ele mostra ao povão que muitos dos acidentes aéreos são
causados por erros humanos, muitos deles pelo ego dos pilotos. O do vídeo,
mentiu de onde partiu, não colocou combustível suficiente, fez mudanças na
aproximação sem informar corretamente. A aviação, que antigamente era muito
elitizada, muitos não gostam que o povão saiba como as coisas aconteceram e
acontecem realmente."
"Eu
nao acredito muito no (nome do canal) sobre segurança aerea. Mas o canal é tem
(sic) uma ótima explicação sobre o funcionamento da aviação."
Esses comentários são representativos de uma imagem enviezada da aviação, dos acidentes aéreos e dos pilotos de um modo geral.
"culpa dos pilotos"
Profissionais sérios da aviação SABEM que mesmo quando um piloto erra, alguém mais já errou lá atrás até chegar nele, já que NÃO HÁ acidente aéreo com apenas UM fator contribuinte.
"muitos não gostam que o povão saiba como as coisas aconteceram e
acontecem realmente"
Mas... será que o "povão" tá recebendo a informação completa? Ou apenas UM dos ângulos?
ótima explicação sobre o funcionamento da aviação.
É muito triste perceber que considera-se apenas UM lado como a totalidade da complexidade chamada "aviação".
Quer a prova? O vídeo a que assisti e analisei NÃO SE APROFUNDOU em:
1) A questão da ERGONOMIA DAS ALAVANCAS DE COMBUTÍVEL do avião acidentado;
2) A TRADUÇÃO MAL FEITA do manual original da aeronave acidentada.
Fora outras questões intrínsecas que, com certeza, estiveram presentes no encadeamento de fatores.
Ou seja: o piloto pode ter cometido erros (e sim, cometeu!) mas pode ter sido, parcial ou totalmente, induzido ao erro, também! (Já pensou nisso?)
Sem contar que, ao me manifestar nos comentários simplesmente indicando onde um dos internautas poderia encontrar resposta sobre um tema não abordado no vídeo – como a aeronave foi retirada de onde ficou encravada – meu comentário foi excluído. Talvez para não dar pistas de onde poderia ser encontrado um conteúdo muito mais completo e não enviezado sobre o mesmo acidente aéreo.
E a conclusão é que para muitos canais, na internet de hoje, temos urgente necessidade de contar com educação mediática – aquela que não é do interesse das chamadas Big Techs – para separar o conteúdo sério do incompleto e/ou sensacionalista.
Recado final: Enquanto estivermos sendo comparsas da espetacularização do que é errado, bem temperado pelo "falem mal, me critiquem mas falem de mim para eu engajar mesmo assim!!!" não serão apenas os pilotos que sairão perdendo, mas toda a Aviação.
===================================================================
