VOLTARÁ A VOAR O PT-ZNF? (CONTINUAÇÃO)
Logo após o último feriado e também na semana passada, após muitos comentários desencontrados via redes sociais, e após termos recebido informações de fonte muito próxima da Embraer, rebatemos a tese de que foi apenas um voo normal de ensaios aquele que, no último dia 12 de outubro, resultou em pouso antecipado do PT-ZNF, o primeiro protótipo do KC-390, promissor avião multimissão militar de transporte da fabricante brasileira. Ao contrário da nota – oficial, mas não expedida amplamente, ou seja, apenas para quem a solicitava – redigida pela Embraer, o jato sofreu um estol abrupto – desceu aproximadamente 17 mil pés em pouco mais de um minuto, chegando a apenas mil pés do solo – após estol do estabilizador horizontal e antecipou seu retorno à pista de Gavião Peixoto declarando ao controle "Mayday". Durante a queda, o avião ultrapassou os parâmetros de força G e de velocidade possíveis de registro pelos instrumentos. A imagem abaixo mostra a variação de velocidade e altitude que fogem ao teste de estol normais, realizados sempre com total controle e rápida recuperação.
"O avião perdeu um flap e outros pequenos pedaços estruturais, mas o mais importante foi, sem dúvida, o flap. Arrancou junto atuadores, roldanas, polias etc. Lá na Embraer, estão com dificuldade de avaliar o fator G atingido. Posso afirmar que 4 G negativos foi medido e comprovado porque é o batente do medidor. Foi mais, portanto, mas para se saber quanto será necessário calcular periciando o quanto o avião teve de deformação estrutural para chegarem a alguma conclusão."
E não ficou só nisso:
"Eu afirmo que esse mesmo avião, no ano passado, já havia sofrido outro dano estrutural em um voo chamado 'stall natural', sem gelo (natural ou artificial), e serve para medir o maior coeficiente de sustentação em função do ângulo de ataque. O avião estolou e despencou também mas, ao contrário do dia 12 passado, não entrou no dorso, atingiu apenas G positivo, mas também foi sério e não previsto. O que eu soube foi que os pilotos tiveram dificuldade para limitar o ângulo de ataque até o máximo durante os ensaios porque não tinham acesso a medidor de AOA (angle of attack), apenas o engenheiro de voo de ensaio a bordo teve acesso a esse parâmetro. O que não é usual neste ensaio específico."
Desde nossa divulgação do dia 18 a repercussão na internet foi acrescida de comentários de toda ordem, alguns sérios, outros acreditando que se tratava de teoria da conspiração, sabotagem, brincadeirinha de mau gosto etc, mas instigou a curiosidade de leigos e de especialistas em aviação. Meus comentários pessoais são estes, resumidamente:
1) Ensaios e voos de certificação existem para isso mesmo, ver onde a aeronave precisa de ajustes e, com certeza, o programa KC-390 receberá esses ajustes. É mais do que natural.
2) Todas as grandes indústrias aeronáuticas já passaram por problemas como esse, em seus novos projetos. Defendo, no entanto, que os fatos sejam esclarecidos, e não ocultados – a Embraer simplesmente blindou seus funcionários, não se toca no assunto, e pronto. Como no caso das falhas das baterias do Boeing 787, por exemplo, tudo deveria vir às claras.
3) O KC-390 não é um avião "de fundo de garagem": é um projeto de uma fabricante de quase 50 anos de tradição que exporta para o mundo todo, aliás, sendo hoje muito mais internacional do que brasileira, o que exige ainda mais de sua competência.
4) A perícia dos tripulantes foi digna de destaque e esperamos que estejam realmente bem, inclusive psicologicamente (não temos informações detalhadas a esse respeito, mesmo sabendo quem são eles).
5) O estresse por que passou o avião poderá sim ter comprometido sua estrutura. Ele poderá ou não voltar a voar. Mesmo este avião, se retornar ao voo, e outros protótipos poderão ou não ter modificações estruturais (como "aletas" ventrais ou geradores de vórtices para melhorar o projeto, que poderá ter seu ritmo alterado, aliás, já o teve, com alguns dias de aeronaves sem voar para os testes).
6) A única maneira de se desmentir as informações apuradas e aqui divulgadas é a apresentação de imagens e gravações originais do voo específico, como acontece em qualquer acidente ou incidente aéreo grave. Lembrando que a Embraer não é obrigada a divulgar tal material, embora seja desejável, em face da polêmica.
Enfim, esperamos mesmo que o primeiro KC-390 brasileiro volte sim a voar, e que isso não demore. É, no mínimo, um belíssimo avião.