segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

PERSONAGEM



F/E Patrício Salva
(Foto: coleção pessoal)


***EXCLUSIVO***

ENTREVISTAMOS O MAIS EXPERIENTE ENGENHEIRO DE VOO AINDA TRABALHANDO NA AVIAÇÃO COMERCIAL BRASILEIRA

Patrício Espinoza Salva é natural de Santiago do Chile e tem três filhos que não trabalham com aviação – para eles avião, só quando são passageiros. Trabalha atualmente como F/E (Flight Engineer, engenheiro ou mecânico de voo, como queiram) da Total Linhas Aéreas, empresa do Grupo Sulista, especializada em transporte de cargas, especialmente para os Correios e Banco Central. A empresa opera hoje três Boeing 727-200F que voam há cerca de 40 anos cada um – verdadeira relíquias, que são o "escritório" de Patrício, cuja profissão está em extinção. Aliás, Patrício é considerado, hoje, o F/E há mais tempo trabalhando no Brasil. Fiz uma entrevista tipo "pingue-pongue" com esse experiente profissional, cujo trabalho já tive o prazer de presenciar ao vivo. Acompanhe.

– O que o trouxe ao Brasil e quando você se mudou para cá?
Patrício: Eu vim pro Brasil em 1978, naquela época a situação econômica e laboral eram muito difíceis no meu país, o Chile passava por mudanças muito profundas.

– Você já trabalhava com aviação, ou tinha feito cursos lá no Chile?
Patrício: O meu primeiro contato com a aviação foi em 1975, quando fiz estágio na Lan Chile como mecânico de manutenção. Passei por várias oficinas, era a última etapa para receber meu diploma de segundo grau e me formar no colégio Salesiano. Eu tinha 17 anos.

– Como começou a trabalhar com aviação comercial?
Patrício: Meu início na aviação foi já aqui no Brasil, em 1979. Apareceu uma vaga de mecânico na Transbrasil, preenchi a ficha e fui selecionado.

– Como era trabalhar na Transbrasil?
Patrício: Foi muito bom, aprendi bastante, foi aí que comecei a gostar do fantástico mundo da aviação.

– Em quais companhias trabalhou até hoje? na Total está desde quando?
Patrício: Em 1982 fui trabalhar no setor de Engenharia da VASP, onde fiquei até 1985, quando fui para o setor de Treinamento de Operações, dei aula dos Boeing 737 e 727, e no Airbus A300. Foi no Airbus que começou a minha carreira de F/E, em 1990. Em 1993, depois que saí da VASP, fui voar o B727 na Itapemirim Transportes Aéreos, foi um marco nas empresas cargueiras no Brasil, e fiquei até o final da empresa, em 1999. No ano 2000 entrei na Total Linhas Aéreas, fiz parte do grupo que implementou a operação do Boeing 727 na empresa e estou na Total até hoje.

– Já passou por algum apuro em voo, alguma emergência ou pane complicada em que seu trabalho foi fundamental para ajuda a tripulação a solucionar o problema ou realizar um pouso bem sucedido?
Patrício: Até hoje não passei grandes apuros em voo, claro que tive situações um pouco difíceis, porém sempre a tripulação se saiu muito bem, é a hora que nós devemos lembrar dos nossos treinamentos em simulador e CRM (Crew Resource Management).

– Um F/E pode ser considerado o ancestral dos computadores de voo das aeronaves mais modernas?
Patrício: Não sei se podemos considerar o F/E como o ancestral do computador dos aviões modernos. Hoje em dia o computador é o principal tripulante na cabine, faz quase tudo, só não faz fonia, daí a importância do copiloto (risos risos) e, obviamente, ele gerencia e monitora o funcionamento dos sistemas da aeronave, que é a função principal do F/E. Para quem operou aeronaves com F/E o computador nunca o irá substituir, um tripulante a mais na cabine é muito bom.

– Fale um pouco mais de sua profissão, no que consiste, especialmente para quem não tem conhecimento a respeito.
Patrício: Como falei, o F/E é responsável por gerenciar e monitorar o funcionamento dos diversos sistemas da aeronave, ele também é capacitado e treinado para fazer cálculos de performances da aeronave nas diferentes fases do voo. É uma pessoa que pode auxiliar muito o comandante com o seu conhecimento de sistemas na hora de uma tomada de decisão.

– Como você avalia a aviação comercial no Brasil ontem e hoje?
Patrício: Antigamente a aviação comercial no Brasil se resumia a três empresas, VARIG, VASP e Transbrasil. A VARIG era aquela empresa chique, fazia voos internacionais, enquanto que a VASP e Transbrasil brigavam – no bom sentido – pelo mercado interno, todo mundo vestia a camisa. Hoje em dia o cenário é diferente, a briga pelo mercado é ferrenha, vale tudo, as empresas são maiores, milhares de dólares envolvidos, joint ventures, code share, participação estrangeira, não existe tanto amor à camisa, existe mais amor ao dinheiro, não que não seja bom mas.... Não se pode comparar, nos últimos 50 anos o mundo mudou muito e a aviação foi junto, não sou saudosista, tudo tem a sua época, mais acho que antigamente tinha um pouco mais de "glamour". Agora, uma coisa não mudou e não mudará, a paixão de voar, só quem voa sabe o que é.

– Algo mais a acrescentar?

Patrício: Grande abraço e bons voos para todos!



Patrício, no Boeing 727-200 da Total, em 2018. Ao fundo, a Primeira-oficial Gisele.
(Foto: Solange Galante)


Um dos "escritórios" onde Patrício trabalha toda semana.
(Foto: Solange Galante)









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