EXCLUSIVO
ALERTA!
"PODE AFETAR A VIDA DE TODO MUNDO"
MARCOS MORENO CARVALHO
Especialista que presta suporte em aprovações de edificações e outras construções, helipontos e aeródromos junto ao DECEA e à ANAC
(por Solange Galante)
Marcos Moreno Carvalho nasceu no Rio de
Janeiro em 1965 e ingressou na Força Aérea em 1985 pela Escola de Especialistas
da Aeronáutica – EEAR. Formado como terceiro sargento, trabalhou de 1987 a 1994
no extinto Serviço Regional de Proteção ao Voo de Belém. Em março de 1994
trabalhou no Serviço Regional de Proteção ao Voo de São Paulo – SRPV-SP, localizado no
aeroporto de Congonhas, e que, desde abril de 2021, passou a se chamar Centro Regional de Controle do Espaço Aéreo Sudeste –
CRCEA-SE. Lá trabalhou até março de 2015, quando foi para a reserva
renumerada (RR) na graduação de suboficial. Portanto,
No CRCEA-SE, órgão subordinado ao DECEA – Departamento de Controle do Espaço Aéreo – trabalhou, logo no início, no setor de análise de processos de Objetos Projetados no Espaço Aéreo – OPEA, helipontos e aeródromos. Contribuiu para várias publicações deste órgão, como também na Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC. Por sua experiência e seriedade nestas análises, recebeu duas medalhas como reconhecimento de seus serviços: as medalhas “Bartolomeu de Gusmão” e “ao Mérito Santos Dumont”.
Representou o Brasil em 2013
no Seminário sobre a Segurança Operacional e Eficiência em Heliportos,
evento realizado pela OACI – Organização de Aviação Civil Internacional – realizado em Lima (Peru), onde participaram também, além do Brasil e do Peru, representantes da Argentina, Uruguai, Chile e Equador.
Hoje, na RR, permanece prestando suporte em aprovações de edificações e outras construções, helipontos e aeródromos junto ao DECEA e ANAC.
Ele procurou diretamente este BLOG para relatar a respeito do Ofício nº 11/DNOR5/19364 de 28 de dezembro de 2021 Objetos Artificiais de Fácil Remoção, publicado pelo DECEA no Site https://aga.decea.mil.br/legislacao. Segundo Marcos Moreno esse Ofício impactará tanto nas construções existentes quanto em fase de aprovação neste órgão em vários lugares do País. Acompanhe a entrevista:
CAIXA PRETA: O que mudou, afinal?
Marcos Moreno Carvalho: Para se compreender exatamente este esclarecimento, faz-se necessário voltar um pouco no tempo. Antes de 15 de outubro de 2015, trinta aeródromos de grande relevância existentes no território nacional possuíam um Plano Específico de Zona de Proteção – PEZPA, que vigoraram por mais de 20 anos, e a partir desta data, da publicação do Ofício, passaram a possuir em vez de PEZPA o Plano Básico de Zona de Proteção – PBZPA.
CAIXA PRETA: Qual a diferença entre um Plano
Específico e um Plano Básico?
Marcos Moreno: A diferença está em que um Plano
Específico é feito especificamente para um determinado aeródromo, enquanto o
Básico é uma regra geral, igual para todos.
CAIXA PRETA: Por que alguns aeródromos possuíam Plano
Específico em vez de um Plano Básico?
Marcos Moreno: Em princípio nestes aeródromos, caso
fossem aplicados o Plano Básico, não conseguiriam operar, então era feito um
Plano Específico para estes aeródromos, levando em consideração os obstáculos
naturais (relevo) e artificiais já existentes. Logo o Plano Específico era
feito sob medida para aquele aeródromo, sem causar nenhum efeito adverso às
operações aéreas, tanto que permaneceram em vigor por tanto tempo. Estes
aeródromos possuíam sua zona de proteção mais elevada, (exceto a Superfície de
Aproximação e Decolagem que permaneceram inalteradas) a fim de que sua altitude
máxima permitida liberaria ou minimizava a influência causada pelo relevo já
alto, portanto violando ou na eminência de violar sua zona de proteção, e suas
possíveis construções.
CAIXA PRETA: Quais aeródromos possuíam Plano
Específico?
Marcos Moreno: O impacto é gigantesco, pois a zona de proteção de cada um destes aeródromos impacta vários municípios, com o rebaixamento da zona de proteção. São estes:
1. Araxá: Araxá
2. Belém: Val de Cans
3. Belém: Belém
4. Belo Horizonte: Pampulha
5. Brasília: Brasília
6. Campo Grande: Campo Grande
7. Canoas: Canoas
8. Corumbá: Corumbá
9. Curitiba: Afonso Pena
10. Fortaleza: Fortaleza
11. Guaratinguetá: Guaratinguetá
12. Goiânia: Santa Genoveva
Goiânia
13. Londrina: Londrina
14. Manaus: Eduardo Gomes
15. Manaus: Manaus
16. Manaus: Flores Manaus
17. Porto Alegre: Porto Alegre
18. Recife: Recife
19. Rio de Janeiro: Campo dos Afonsos
20. Rio de Janeiro: Jacarepaguá
21. Rio de Janeiro: Santos Dumont
22. Rio de Janeiro: Santa Cruz
23. Salvador: Salvador
24. Santa Maria: Santa Maria
25. São José dos Campos: São José dos campos
26. São Paulo: Guarulhos
27. São Paulo: Campo de Marte
28. São Paulo: Congonhas
29. São Paulo: Base Aérea de Santos
30. Vitória: Vitória
CAIXA PRETA: O que mudou no voo das aeronaves que
operam nestes aeródromos?
Marcos Moreno: Como disse antes, o Plano Específico protegia a zona de proteção meio que quase no limite, se os morros, montanhas e outros obstáculos naturais ou artificiais não fossem retirados. As aeronaves tem que seguir na mesma altitude de antes, com o risco de acidentes aéreos se não observarem esta altitude mínima. O fato de se tornarem Planos Básicos com altitudes restritivas mais baixas não permite automaticamente voos em altitudes menores, alguns aeródromos como o Campo de Marte – SBMT e Internacional de Guarulhos – SBGR, não possuem circuito de tráfego pelo setor norte (início da serra da Cantareira) e voos por ali, somente ocorrem em altitudes muito elevadas. O aeroporto de Pampulha está circundado por elevações naturais. Conclui-se, então, que para as aeronaves que operam nestes aeródromos quase nada mudou. Em compensação, para as construções existentes e para as novas construções dentro dos municípios impactados por estes aeródromos a modificação foi enorme. Para ilustrar este impacto, o aeródromo Campo de Marte sofreu uma redução drástica a partir de sua Superfície Horizontal Interna onde sua restrição pelo Plano Específico era de 145 m acima da elevação do aeródromo e passou para apenas 45 m com a aplicação do Plano Básico, uma perda de 100 metros.
CAIXA PRETA: Então varias construções que não
violavam o PEZPA passaram a violar o PBZPA?
Marcos Moreno: Sim, conclusão óbvia,
incluindo vários edifícios antigos, orgulho de São Paulo, por sua altura,
prédios com helipontos aprovados pelo próprio DECEA, torres de telecomunicações
e inúmeras outras construções.
CAIXA PRETA: O que foi realizado nas legislações do
DECEA em relação às novas construções?
Marcos Moreno: Quase nada foi
acrescentado nas legislações do DECEA, apesar de terem sido publicadas novas
regras, a maioria já existia quando estes aeródromos possuíam o Plano
Especifico de Zona de Proteção. A essência das regras era que o órgão regional
do DECEA não poderia autorizar novas implantações que violassem o Plano de
Zona de Proteção, apenas com algumas exceções lógicas:
a. -
Possuir altura máxima de oito metros na superfície horizontal interna e dezenove metros na
Superfície Cônica, independentemente da altitude do terreno em sua base,
obviamente por considerar que estas alturas nestes lugares são desprezíveis,
onde aeronaves em condições de voo normais ou em contingência não seriam
influenciadas negativamente nas operações aéreas. Mas é pouco eficiente: apenas
utilizados em pequenas construções como casas e sobrados.
b. - Princípio da sobra – para o caso de novas construções construídas a uma certa distância de outras já construídas (existentes) e aprovadas pela legislação da época. Esta regra mudou bastante, hoje não se consegue construir na mesma altura do objeto existente, denominado de “originador da sombra”, pois a regra desta sombra é um cone invertido com gradiente negativo de 10% e só tem eficácia até 150 metros de distância. Este é o mais utilizado, apesar de bastante restritivo, assim, ainda é possível novas construções de edificações onde existam outras mais altas bem próximas. Também é a mais lógica, se já existe uma edificação alta, violando o novo Plano Básico mas que não existam voos em uma altitude menor do que ela. Mas, por que não aprovar uma outra, mais baixa, próxima e sombreada por aquela?
c. -
Interesse público – Este sem duvida é o menos usado, devido à quantidade de
órgãos envolvidos no processo, vária consultas e o próprio interesse público da
administração municipal, estadual ou federal na nova construção.
CAIXA PRETA: O que consta no Ofício nº 11/DNOR5/19364 de
28/dez/2021? Quais os impactos?
Marcos Moreno: Tem muito haver,
sem a explicação desta parte anterior, dificilmente se entenderia o impacto
causado por este “simples” Oficio emitido pelo DECEA direcionado aos seus
órgãos regionais, que são aqueles que aprovam as novas implantações.
PRIMEIRO IMPACTO: construções já existentes
O primeiro texto do
Ofício 11 impacta nas construções existentes que não eram obstáculos e que
agora, com a redução das superfícies limitadoras de Zona de Proteção dos
aeródromos que perderam o Plano Específico, se tornaram “obstáculos”.
O texto é exatamente este:
“Quando os obstáculos são
identificados, o operador aeroportuário, com o auxílio dos Órgãos Públicos
locais, deve envidar esforços para que ocorra a sua remoção ou o rebaixamento
de seus topos. Se o obstáculo é um objeto simples tais como: uma árvore, antena
ou uma chaminé, poderá ser possível um acordo para reduções de suas alturas
para um limite aceitável, mitigando, assim, o seu efeito adverso. Em outros
casos, como por exemplo edifícios, poderá ser necessário a remoção de toda a
estrutura.”
O texto inicia com objetos julgados simples e evolui até os edifícios e defende que os operadores aeroportuários junto com os órgãos públicos locais devam promover a sua remoção ou o rebaixamento. Não menciona ou ignora o direito adquirido daquele objeto existir de acordo com a legislação na época de sua construção. Aparentemente ignora a Instrução do Comando da Aeronáutica, a ICA 63-19 aprovada pela Portaria DECEA N° 292/DGCEA, de 02 de dezembro de 2020, que entrou em vigor no dia 04 de janeiro de 2021, e ainda continua em vigor, também disponível no site do DECEA, que diz no capítulo “critérios da sombra”:
“No caso da superfície
de aproximação, na segunda seção e na seção horizontal, da superfície de
decolagem, além de 3000 metros, da superfície horizontal interna, da superfície
cônica e da superfície de proteção de auxílios à navegação aérea, os obstáculos
naturais e artificiais irremovíveis poderão encobrir outros obstáculos. Serão
considerados objetos artificiais irremovíveis aqueles
que tenham sido implantados em observância às normas do COMAER vigentes à época
de sua implantação e que tenham recebido autorização da Administração
Municipal”.
A pergunta que fica é: Como o DECEA quer que removam ou rebaixem qualquer construção que seja se são considerados irremovíveis aquelas já aprovadas e com o direito de estarem lá? Lembrando que se hoje são obstáculos, foi apenas pelo ato do próprio DECEA de cancelar os Planos Específicos e transformar 30 aeródromos em Planos Básicos!
SEGUNDO IMPACTO:
construções novas
O outro texto do
Ofício 11 impacta nas construções novas, limitando o que pode ser utilizado
com originador da sombra (princípio da sombra já comentado anteriormente) por
classifica-los como “objetos artificiais de fácil remoção”.
O termo “objetos artificiais de fácil remoção” já é citado na ICA 63-19/2020 e na versão anterior da legislação pertinente. O texto anterior era “Para fins de aplicação deste princípio, a vegetação, bem como objetos artificiais de fácil remoção, não constitui objeto gerador de sombra” e na versão atual de 2020 passou a ser “Para fins de aplicação deste princípio, a vegetação, bem como objetos artificiais de fácil remoção, como postes e antenas, não constitui objeto gerador de sombra.”
Veja que na versão do final de 2020, o DECEA já classifica postes e antenas como sendo de fácil remoção, apesar deste conceito ainda ser vago, ainda temos o conceito de objetos artificiais irremovíveis, justo e claro que limitaria qualquer interpretação abusiva de quais seriam estes outros objetos de fácil remoção.
Vejamos então o texto do Ofício nº
11/DNOR5/19364:
“Neste sentido,
embasando-nos nas experiências e expertises adquiridas ao longo dos anos nas
análises de processos, devido à falta de documentações e/ou legislações
internacionais sobre o tema, o SDOP definiu como sendo objetos artificiais de
fácil remoção, todo o objeto em que haja a possibilidade remoção ou
rebaixamento de forma viável e rápida tecnicamente, assim que seja identificado
o seu o efeito adverso OPEA nas operações aéreas. Assim, esses objetos são
exemplificados como: a) postes; b) antenas; c) mastros; d) torres de
telecomunicações; e) objetos de estrutura esquelética metálica; e f)
para-raios.”
Ficando de fora estranhamente apenas
torres de linhas de transmissão, digo estranhamente não por não concordar, mas
por que apenas as torres de linha de transmissão? Será que somente este objeto
a sua retirada ou rebaixamento é inviável, os demais, são fáceis, viáveis e
rápidos tecnicamente?
CAIXA PRETA: Qual a sua conclusão?
Marcos Moreno: Para as construções existentes e classificadas como “obstáculos” dá-se a impressão que estas implantações foram construídas à revelia de autorizações municipais, estaduais ou federais e, por isso, seria simples seu rebaixamento ou mesmo sua remoção. Coloco “obstáculos” entre aspas, porque só ganharam esta denominação com a transformação dos principais aeródromos do país em PBZPA – Plano Básico.
Para novas construções, o princípio de sombra, que é um princípio lógico e inteligente, viável e previsto em legislação, inesperadamente, dependendo de seu originador, não poderá mais ser empregado. Como se as aeronaves pudessem contornar estes objetos e colidir com outros objetos, menores, sombreados por estes “obstáculos”...
Se você, leitor, se interessou, divulgue e ajude a esclarecer os mistérios deste Ofício. Eu mesmo já enviei o questionamento ao DECEA por duas vezes sem êxito. Não sei quando se iniciará o rebaixamento ou retirada das construções existentes, chamadas de “obstáculos”, mas os órgão regionais do DECEA já estão emitindo pareceres desfavoráveis quando são utilizados objetos originadores da sombra citados na lista do Ofício 11 como “objetos de fácil remoção”.
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